A presidente do júri da Berlinale 2011, Isabella Rossellini, lê a carta aberta de Jafar Panahi | Festival Profile |

A cadeira do cineasta irariano Jafar Panahi no júri da Berlinale, ao lado de Isabella Rossellini, permanecerá vazia.
Este está preso no seu país e, como gesto de apoio, o festival exibirá vários dos seus filmes, entre os quais Fora do Jogo, que ganhou o Urso de Prata em 2006. O título é uma referência à posição das mulheres dentro da sociedade irariana, até mesmo no contexto do futebol.

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O mundo de um cineasta é marcado pela interligação entre a realidade e os sonhos. O cineasta usa a realidade como a sua inspiração, pinta-a com a cor da sua imaginação, e cria um filme que é a projecção das suas esperanças e dos seus sonhos.
A realidade é que tenho sido impedido de filmar nos útlimos cinco anos e fui agora oficialmente condenado a ser privado desse direito por mais vinte anos. Mas sei que continuarei a tornar os meus sonhos em filmes na minha imaginação. Admito, como cineasta socialmente consciente, que não poderei retratar os problemas e preocupações quotidianos do meu povo, mas não me vou negar a sonhar que, ao fim de vinte anos, todos os problemas terão desaparecido e farei filmes sobre a paz e a prosperidade no meu país quando voltar a ter essa oportunidade.
A realidade é que me privaram de pensar e escrever por vinte anos, mas não me podem impedir de sonhar que, daqui a vinte anos, a inquisição e a intimidação serão substituídas pela liberdade e pelo pensamento livre.
Privaram-me de ver o mundo durante vinte anos. Espero, quando estiver livre, ser capaz de viajar por um mundo sem barreiras geográficas, étnicas e ideológicas, onde as pessoas viverão juntas em liberdade e paz independentemente das suas crenças e convicções.
Condenaram-me a vinte anos de silêncio. Mas nos meus sonhos grito por um tempo em que possamos tolerar-nos mutuamente, respeitar a opinião de cada um, e viver uns para os outros.
A realidade do meu veredicto é que devo passar seis anos na prisão. Viverei os próximos seis anos esperando que os meus sonhos se tornem realidade. Desejo que os meus colegas cineastas em todos os cantos do mundo continuem a criar filmes tão bons que, quando sair da prisão, eu seja inspirado a continuar a viver no mundo que eles sonharam nos seus filmes.
A partir de agora, e pelos próximos vinte anos, sou forçado ao silêncio. Sou forçado a não poder ver, sou forçado a não poder pensar, sou forçado a não poder fazer filmes.
Submeto-me à realidade do cativeiro e dos captores. Procurarei a manifestação dos meus sonhos nos vossos filmes, esperando encontrar neles aquilo de que me privaram.

Kommentare

  1. O rato do meio já caiu.
    .
    Por um lado temo pelo que vem a seguir, mas logo sou invadido pelo sentimento de que é aos egípcios que compete decidir o que vão ter.

    Mesmo que seja um Irão II, nunca será para sempre.

    Quanto mais Irãos mais os povos ficarão vacinados para essa opção... ou não.

    É tão fácil eu cair numa visão euro-centrista, quando na verdade são eles que têm de decidir. Se nós por cá não nos livramos do Sócrates, de Passos Coelho e de Portas que moral temos para falar sobre as consequências de quem tem coragem para mandar embora quem não tem o seu apoio?

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  2. A Irmandade Muçulmana, principal força da oposição no Egipto, destacou hoje "o triunfo pacífico do povo" egípcio e assegurou que a renúncia do Presidente Hosni Mubarak é o começo de uma nova etapa na história do país.
    Gostava de saber o que significa para as mulheres egípcias essa nova etapa.

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  3. Anonym2/11/2011

    Faz hoje 32 anos que o Xá foi derrubado. Parece não ter nada a ver com este post, mas o que me ocorreu de imediato foi que, pela coincidência da data, talvez daqui a uns anos estja a acontecer o mesmo com um realizador egípcio.

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  4. O meu post tem muito a ver com a queda do Xá há 32 anos e a queda do Mubarak no dia de hoje.
    O Carlos compreendeu o meu receio
    — que daqui a uns anos esteja a acontecer o mesmo com um realizador egípcio o que está a acontecer nesta altura ao Jafar Panahi.

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