A universidade massificou-se mas não se democratizou

Diferenciar para democratizar a universidade é uma das conclusões dos resultados preliminares de dois estudos sobre o abandono escolar e sucesso no Ensino Superior que foram apresentados na Universidade do Porto.

Expresso
Sabia que os alunos que ingressam no ensino superior com notas altas são os que têm mais sucesso escolar? Sabia que alunos que ingressam no Ensino Superior filhos de pais com formação até ao 4º ano têm menores taxas de abandono e insucesso? Que em cada sete alunos do Ensino Superior, apenas um é filho de pais operários? Ou ainda que o grupo de amigos influencia directamente estes factores? Estes são alguns dos resultados dos projectos "Factores de Sucesso e Abandono Escolar no Ensino Superior em Portugal" e "Os Estudantes e os Seus Trajectos no Ensino Superior: Sucesso e Insucesso, Factores e Processos de Boas Práticas". O objectivo é qualificar os factores do sucesso e abandono escolar de modo a lançar bases para uma plataforma de intervenção.
"Não importam apenas dados estatísticos relacionados com o sucesso e abandono escolar se não analisarmos os factores qualitativos e as muitas variáveis que os caracterizam", explica José Manuel Mendes, presidente do Conselho Científico do Centro de Estudos Sociais da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra (FEUC-CES), que coordenou o primeiro deste projectos. Para o sociólogo é importante qualificar os factores de sucesso e abandono dado que existe uma série de processos alternativos que podem influenciar os resultados escolares. "Seis em cada sete alunos vêm da burguesia ou burguesia técnica, ou seja, um filho de um profissional liberal, por exemplo, tem seis vezes mais probabilidades de ingressar no ensino superior do que o filho de um operário Isto significa que a universidade se massificou mas não se democratizou e continua orientada para as elites. É preciso criar mecanismos para que todos possam ultrapassar as barreiras", explica José Manuel Mendes.
O projecto "Factores de Sucesso e Abandono Escolar no Ensino Superior em Portugal" teve por objectivo entender como os indicadores influenciam as políticas públicas relacionadas com o ensino superior em Portugal, tal como os financiamentos das instituições de ensino, e a consequente necessidade de instrumentos de monitorização mais aprofundados. "As instituições têm de se adaptar às necessidades dos alunos e implementar práticas de monitorização dos estudantes. A homogeneização das práticas não é adequada quando o indivíduo é heterogéneo", explica José Manuel Mendes.
Este estudo permitiu, por exemplo, saber que a nota de entrada no ensino superior está directamente relacionado com o sucesso escolar: os alunos que entram com notas mais altas são os que fazem menos retenção escolar e os que acabam a licenciatura com melhores notas. Do mesmo modo, as conclusões preliminares do projecto indicam que os filhos de pessoas com estudos até à 4ª classe são os que têm as menores taxas de abandono e retenção escolar, tanto por falta de condições financeiras que lhes permitam prolongar os estudos para além dos anos em que está previsto fazer-se a licenciatura, como também porque chegam muito menos ao ensino superior. O estudo aponta ainda que o facto de se ingressar na universidade na primeira opção não tem qualquer relevância no sucesso escolar.

"O melhor antídoto contra o desemprego e precariedade é a licenciatura"
"Temos de passar do pronto a vestir para o fato por medida", diz João Teixeira Lopes, presidente do Instituto de Sociologia da Faculdade de Letras da Universidade do Porto e co-coordenador do projecto "Os Estudantes e os Seus Trajectos no Ensino Superior: Sucesso e Insucesso, Factores e Processos de Boas Práticas". O estudo que vai ser apresentado ao Ministério foi desenvolvido pelo Instituto de Sociologia da Faculdade de Letras da Universidade do Porto (ISFLUP), em parceria com o Centro de Investigação e Estudos de Sociologia (CIES).
Este projecto pretendeu desvendar os factores que influenciam o sucesso e insucesso escolar, incidindo na Universidade do Porto. O estudo privilegia a sistematização dos resultados respeitantes aos principais indicadores estatísticos, análise organizacional e narrativas biográficas, reflectindo igualmente sobre as dificuldades e ambiguidades associadas à definição, avaliação e mensuração do sucesso escolar no ensino superior.
"Os dados estatísticos oficiais, nacionais e internacionais, medem a realidade de uma forma pobre e apenas servem para melhorar indicadores. Para além de se contabilizar quem entra e quem sai, há outros factores que têm de ser analisados. Por exemplo, o facto de um aluno ingressar no mercado de trabalho enquanto estuda, o grupo de amigos, a existência de mudanças bruscas no seio familiar, o ter filhos, são factores que têm um papel que pode ser determinante no sucesso/insucesso escolar. Se a condição social é um factor que influencia resultados, também é verdade que há alunos da mesma condição social que apresentam resultados diferentes. São questões muito complexas. Cada pessoa é um ser irrepetível. As instituições têm de se adaptar às singularidades de cada um ", explica Teixeira Lopes.
Os investigadores alertam ainda que o "melhor antídoto contra o desemprego e precariedade é a licenciatura". Mesmo considerando o desemprego que tem crescido entre os jovens licenciados, entre os países da OCDE, Portugal tem a mais alta taxa de emprego de licenciados e a média de salários é de 1,5 a duas vezes superior. Ainda assim, entre os 18 e os 25 anos, apenas 30% dos jovens frequentam o ensino superior.

PERSEUS

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