O 16º encontro do Círculo Literário

No encontro do Círculo Literário de hoje discutimos sobre Atemschaukel
(Tudo o que tenho levo comigo) de Herta Müller, Nobel de Literatura de 2009.
O romance relata a perseguição sofrida pela minoria alemã da Roménia após a Segunda Guerra Mundial, e o sofrimento dos alemães recrutados pela União Soviética para servir em campos de trabalho muito similares aos campos de extermínio nazistas. Herta Müller, ela mesma parte da minoria que retrata — de ascendência alemã, a escritora nasceu em 1953 em Niţchidorf — descreve o árduo dia a dia dos cativos do regime soviético numa linguagem imaginativa e poética. Não é uma leitura fácil, mas vale a pena o esforço.

"Depois dos cinco anos no campo de trabalho eu vagava dia após dia pelo tumulto das ruas, ensaiando mentalmente as melhores frases para o caso de ser preso: PRESO EM FLAGRANTE — pensei em mais de mil desculpas e álibis para essa acusação. Levo comigo uma bagagem silenciosa. Fechei-me tão profundamente e por tanto tempo no silêncio que nunca consigo abrir-me através das palavras. Apenas me fecho de outras formas quando falo.
No último verão de rendez-vous, para prolongar o caminho de volta do Erlenpark até em casa, entrei por acaso na igreja da Santíssima Trindade da Grosser Ring. Esse acaso atuou como destino. Eu vi os tempos que estavam por vir. Ao lado do altar lateral, numa coluna, estava o santo com seu manto cinza, e levava à guisa de gola um cordeiro na nuca. Esse cordeiro na nuca é o silêncio. Há coisas sobre as quais não falamos. Mas eu sei do que estou falando quando digo, o silêncio na nuca é diferente do silêncio na boca. Antes, durante e depois do meu tempo no campo de trabalho, durante vinte e cinco anos vivi com medo, do Estado e da família. Da dupla queda: que o Estado me encarcerasse como um criminoso e que a família me repudiasse como uma desonra. No meio da multidão nas ruas, me vi no reflexo das vitrines, das janelas dos bondes e das casas, nos chafarizes e poças, pensando incrédulo que talvez eu fosse mesmo transparente.
Meu pai era professor de desenho. E eu, com as termas Netuno na cabeça, me encolhia como se me tivessem dado um chute quando ele usava a palavra AQUARELA. A palavra sabia o quão longe eu havia ido. Minha mãe dizia à mesa: Não parta a batata com o garfo, ela vai se desfazer; use a colher, o garfo se usa para a carne. Minhas têmporas latejavam. Por que ela fala de carne se se trata de batata e um garfo. De que carne ela está falando. Os rendez-vous me haviam virado a carne do avesso. Eu era o meu próprio ladrão, as palavras caíam inesperadamente e me atingiam."
Trecho de Tudo o que Tenho Levo Comigo, de Herta Müller (Companhia das Letras, tradução de Carola Saavedra)

Der Untertan (O Súdito) de 1914, considerado a obra-prima de Heinrich Mann, foi o livro escolhido para o próximo encontro do Círculo Literário a 12 de Agosto de 2011 em Düsseldorf-Benrath.

Kommentare

  1. Anonym5/27/2011

    Huum...
    A mim cansou-me tanto. Achei-o tão repetitivo que o pus de lado, como sabes.
    Talvez um dia destes ceda:))

    bji

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  2. Penso que, a culpa é da tradução, Nina!

    A linguagem inovativa de Herta Müller é muitíssimo difícil de traduzir na nossa ou noutra língua.

    Caso um dia leias este excelente livro, quero saber a tua opinião.

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  3. Pois, essa tradução parece para português do Brasil. E que faz um bocadinho de diferença...

    Hoje também fiquei sem poder comentar, mas parece que agora já está OK!

    Beijocas e bom fim de semana!

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  4. É bom que não nos esqueçamos nunca mas não só da superfície como também do que se dizia é que por vezes iremos encontrar semelhanças assustadoras ...

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  5. Curiosa coincidência. Neste mesmo dia estive também numa tertulia literária. O tema e o livro (em construção)conhece bem e até o orador é seu conhecido. Houve debate vivo e muito aplaudido...

    28. Mai 2011 19:51

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