A TORPE DITADURA DA MAIORIA - Vasco Graca Moura

A aparente firmeza com que o Ministério da Educação tem procurado aguentar os protestos dos professores está a ruir como um castelo de cartas. Até alguns altos responsáveis do PS vieram reconhecer em público a lesão de popularidade que o partido está a sofrer.
A situação atingiu um ponto tal que todos os ângulos por que as coisas sejam encaradas contêm uma parcela de verdade. Uma avaliação é necessária; as avaliações previstas são impraticáveis e insensatas; há muitos professores que não aceitam qualquer espécie de avaliação; é patente a incapacidade de o Governo negociar com os sindicatos; é patente que os sindicatos andam a fintar o Governo; há muita mais gente envolvida para além dos sindicalizados; há estudantes que não saberão do que estão a falar; há pais completamente equivocados... Enfim, há espontaneidade de manifestações, mas também há manipulações e instrumentalizações dos protestos, o que é muitíssimo bem feito: deve lembrar-se ao PS a figura vergonhosa que, entre manipulações e instrumentalizações, muitos dos seus apaniguados fizeram em 1992, nos tempos do buzinão na Ponte 25 de Abril e nas portagens de Sacavém.
Mas as coisas não se ficam pelo Ensino. Na área da Saúde, a ministra tem metido os pés pelas mãos, incapaz de confessar o falhanço da sua política e até de abarcar a dimensão financeira dos problemas do seu ministério. Em contraponto com ela, vemos agora na área da Cultura o ministro Pinto Ribeiro a sacudir a água do capote e a entoar plangentes desabafos, porque não lhe dão o dinheiro de que precisa, culpando genericamente os seus antecessores. É fraca desculpa dizer que é por causa deles que o ministério "perdeu a credibilidade", sem especificar mais do que aquilo a que chama orçamentação e execução deficientes. Então não consegue restaurar a credibilidade nem convencer o ministro das Finanças daquilo de que precisa? As consequências desta confissão patética são complicadas.
Com efeito, não só José António Pinto Ribeiro não poderá fazer nada do que anunciou, como é atingido de pleno pelo comentário assassino de Isabel Pires de Lima ("Mas a pouca verba que recebeu não deve afligi-lo. Prometeu fazer mais com menos, o ministro das Finanças fez- -lhe a vontade"). E dá o flanco, de modo que a toda a gente é lícito um comentário paralelo a este: então onde é que está a credibilidade pessoal com que este ministro e a validade dos seus projectos foram sendo apresentados?
O tempo mostrará que falharão também as suas pretensões quanto a receber 1% do valor das empreitadas de obras públicas, até porque isso só significará que vamos todos, como contribuintes, pagar esse 1% que os empreiteiros farão acrescer à factura. E falharão ainda quanto ao QREN, por muito que o Governo planeie despejar a rodos os fundos europeus, atrasando a sua distribuição para dispor de um maná eleitoral. Isto para não falar dos rios de dinheiro que, sempre segundo o ministro, iriam ser injectados nas políticas da língua portuguesa...
Aliás, numa fase em que o Estado se mostra finalmente disposto a pagar dentro em breve as suas dívidas às empresas, acabando por dar razão às exigências de Manuela Ferreira Leite, seria interessante que pelo menos pagasse também o que o Ministério da Cultura deve às autarquias, até para que estas possam, por sua vez, pagar a muitas empresas privadas suas credoras.
Manuela Ferreira Leite também acaba de pôr a nu as actuações chocantes do ministro da Agricultura, a sua falta de sensibilidade aos problemas, o nenhum rigor nas suas soluções, a incompetência na actuação dos seus serviços, os atrasos na atribuição de fundos estruturais por razões de puro eleitoralismo, os danos irreversíveis que tudo isso está a causar aos nossos agricultores.
Este Governo é de uma insensibilidade total aos problemas dos portugueses. Quer concentrar o poder e perpetuá-lo nas suas mãos. Não recua perante nada para atingir esses objectivos. Vivemos numa torpe ditadura da maioria. Mas ela começa a meter água por todos os lados.

Diàrio de Notícias

Kommentare

  1. Estamos mais próximos de uma ditadura do que de uma democracia.
    Fala-se muito, escreve-se muito, dizem-se muitas verdades, muitos disparates e mentiras. Não é verdade que os professores não querem ser avaliados; não é verdade que o modelo de avaliação é simples, pelo contrário, é um monstro de burocratização, que denota claras falhas de equidade, para além de não demonstrar qualquer indícios de melhoria para a qualidade de ensino ou das aprendizagens... enfim, fico-me por aqui porque não vejo nada de bom neste modelo. Mas o pior de tudo e é bom não esquecer, os pôdres não estão só no modelo de avaliação, todas as políticas educativas desta tutela estão a conduzir a educação para um abismo. E vamos todos juntos... os alunos vão ser os mais prejudicados porque eles são o futuro do país.

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  2. Tenho admiração por Vasco Graça Moura, como tradutor e escritor. Contudo, como político acho-o do mais faccioso que existe, as críticas que faz adaptam-se como uma luva aos tempos em que Cavaco Silva era PM e tinha a maioria absoluta. E aí ele defendia-o com unhas e dentes, mesmo que fosse igualmente cego em relação aos problemas do povo em geral - em que o buzinão, foi a parte visível do descontentamento popular.

    Quanto aos professores, concordo que o modelo é burocrático e inadequado (pelo que li e ouvi, porque não sou professora), mas também muitos professores dizem que sim à avaliação noutros moldes, mas na realidade não apresentam contra-propostas para sanar os problemas, o que diz muito sobre essa "vontade" que têm de ser avaliados... Isto com mais uns sindicalistas a quererem protagonismo é um novelo complicado de desembaraçar...

    Saudações outonais!

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  3. Estou longe e mal informada sobre este assunto.
    Ontem li o artigo do Vasco Graca Moura (dele só conheco "Duas Mulheres em Novembro") no Diàrio de Notícias, e resolvi colocá-lo no "ematejoca azul" para ver as reaccoes.
    Há uns dias uma amiga, que também é professora, esteve a falar sobre a situacao dos professores em Portugal até às 3 da manha. Eu ía adormecendo... Todavia tenho interesse do que se passa na minha Pátria.

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  4. Bom-Dia Teresa

    Isto é assunto polémico, em primeiro lugar por Vasco Graça Moura ser um óptimo profissional, é verdade, grande tradutor, escritor, igualmente, mas sempre foi um comissário político do PSD. Os males na economia portuguesa, que este senhor aponta, vêm desde o tempo em que a Drª Manuela Ferreira Leite esteve no poder. Os males da educação e da cultura arrastam-se desde sempre, nenhum deles pode apontar o dedo ao outro.

    Não gosto de falar de política, deixei o ensino, não me interessa perder tempo com alunos mal-educados e em processo de idiotismo genético. Este é o verdadeiro estado desta nação. Os Professores não têm qualquer autoridade, têm cargas horárias desumanas, não têm tempo para as suas próprias famílias, o trabalho burocrático sobrepõe-se ao objectivo do que deveria ser uma escola. Sim, tudo é falseado no ensino, a favor do sucesso escolar.
    Escamoteiam-se os resultados. Os professores também são responsáveis por isso. A maioria dos alunos entra nas faculdades sem saber expressar uma ideia, sem saber escrever. São intelectualmente diminuídos, limitam-se a citar e nem conseguem justificar as citações que escolhem.

    Eu nestas questões não sou nada meiga, irrita-me ver os jovens sem educação, sem ideias, obtusos e arrogantes, como agora o são na generalidade. Mas isto entra em choque com os princípios de inclusão de todos na escola...acabam por excluir todos.
    Gostaria de lembrar Ruben A. e Francisco de Sá Carneiro, tem de haver uma elite, sem ela não há possibilidade de uma nação se desenvolver culturalmente, economicamente. Mas Portugal é governado por carreiristas políticos.

    Para terminar eu pergunto, onde esteve o Exmº Sr. Dr. Vasco Graça Moura, quando a Srª drª Leonor Beleza não mandou retirar dos hospitais os lotes contaminados de factor viii para os hemofílicos, vindos da Áustria? Esteve ao lado da srª Ministra, esteve contra as vítimas.

    Por esta razão e por reconhecer o alto nível intelectual de Vasco Graça Moura, fico triste por ver a sua cegueira e parcialidade políticas.

    Mas em democracia todos têm direito a emitir as suas opiniões.
    Hoje fui um pouco vinagre, mas entristece ver guerrinhas mesquinhas, quando o mais importante seria reunir esforços no sentido de haver consensos. Não vale a pena bater no ceguinho.

    Beijinhos,
    Isabel

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  5. E agora a parte cómica, quando li o comentário sobre a tradução de Kaka-Du só me ri. Enquanto estive no recobro estavam outras que falavam pelos cotovelos. A conversa girava, invariavelmente, à volta das trompas de falópio. Bom, eu estava atrapalhada com as taquicardias e o meu ex-marido dizia-me:" Anjinho as portuguesas muito kaka-du fazem!"

    Beijinhos,
    Isabel

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  6. Teresa deixei o meu comentário ao KAKADU, em Pepper. É palavra que vai ficar.

    Até logo, tenho o sr. Ellison a querer passear-se em cima das teclas.

    Beijinhos,Isabel

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