Portugueses estão entre os europeus que mais desconfiam do próximo, revela inquérito

Portugal é um dos países europeus onde os cidadãos menos confiam nos outros, revelam os resultados do Inquérito Social Europeu, um projecto que desde 2001 estuda e compara os valores e atitudes sociais na Europa. Os portugueses são ainda dos europeus mais tristes e descontentes com a política.
Em Portugal, a realização do inquérito é assegurada por um consórcio constituído pelo Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa e pelo Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa (ISCTE). A terceira fase do estudo, iniciada em 2006, é hoje apresentada no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa e tem duas temáticas principais: os tempos de vida e o bem-estar na Europa.
A partir de entrevistas face-a-face realizadas em casa de 2222 portugueses, entre Outubro de 2006 e Fevereiro de 2007, o ESS III (na sigla em inglês) conclui que "desde 2002 que Portugal faz parte do grupo de países com menores níveis de confiança" e que apresenta sempre "níveis de confiança abaixo do ponto médio da escala", tal como a Polónia, a Hungria e a Eslovénia.
O trabalho, coordenado em Portugal pelo professor do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa Jorge Vala, procedeu a "uma análise longitudinal (2002 até 2006) dos padrões de confiança interpessoal em 17 países europeus, procurando aferir variações nos níveis de confiança e identificar antecedentes e consequentes da confiança interpessoal".
Os resultados relativos à confiança interpessoal foram obtidos a partir das respostas às questões: "de uma forma geral, acha que todo o cuidado é pouco quando se lida com pessoas ou acha que se pode confiar na maioria das pessoas?"; "acha que a maior parte das pessoas tentam aproveitar-se de si sempre que podem, ou pensa que a maior parte das pessoas são honestas?" e "acha que, na maior parte das vezes, as pessoas estão preocupadas com elas próprias ou acha que tentam ajudar os outros?".
Tal como os portugueses, também os polacos, húngaros e eslovenos tendem a desconfiar da honestidade dos outros, ao contrário dos nórdicos. Suécia, Finlândia, Noruega e Dinamarca são os países com os níveis mais elevados de confiança entre as pessoas.
Num nível intermédio, estão Espanha, França, Bélgica, Áustria, Reino Unido, Holanda, Suíça e Irlanda, que completam os 17 países europeus que participaram em todos os três momentos de inquirição do ESS: 2002, 2004 e 2006.
Os autores do estudo associam a grande desconfiança interpessoal a uma "baixa interajuda e associativismo que é frequente verificar na nossa sociedade".
A confiança no futuro também tem níveis baixos em Portugal. "Os resultados mostram que os inquiridos portugueses evidenciam uma confiança no futuro mais baixa do que aquela que se verifica em média nos países com um PIB (Produto Interno Bruto) inferior", indicam.
No que diz respeito à confiança nas instituições, os portugueses manifestaram uma confiança maior do que a reportada por países com PIB inferior, mas, mesmo assim, muito abaixo de estados com uma produção de riqueza média.
"De um modo geral, a baixa confiança interpessoal e a baixa confiança no futuro podem ser fruto da baixa confiança depositada nas instituições, uma vez que estas possuem um papel referencial das relações que se estabelecem em sociedade", concluem.

Sair tarde do ninho
Segundo este Inquérito Social Europeu , os portugueses são também os europeus que começam a trabalhar mais cedo, mas estão entre os que saem mais tarde de casa dos pais.
"Portugal é o país onde, em média, a primeira experiência laboral acontece mais cedo, em torno dos 17,7 anos", revela o estudo que conclui que as "entradas no mercado de trabalho mais precoces não se traduzem, no entanto, em imediata transição residencial".
Em Portugal, a saída de casa dos pais só ocorre, em média, quatro anos depois da primeira experiência laboral, ou seja, aos 21 anos.
A idade para a entrada no mercado de trabalho em Portugal está muito perto da média do que acontece na Alemanha e na Suíça - ligeiramente abaixo dos 18 anos -, mas no extremo oposto de países com sistemas de ensino obrigatório mais longos e consolidados há mais tempo, como a Estónia, a Eslovénia e a Bulgária, onde o primeiro emprego só aparece depois dos 20 anos de idade.
"Já na Bulgária ou no Chipre, à entrada no mercado de trabalho, apesar de tardia, sucede a independência da casa parental, não chegando a um ano o intervalo que medeia essas transições", refere o estudo desenvolvido em países comunitários e não-comunitários.
A Estónia é o único país onde esta transição é "invertida", ou seja, o abandono da casa dos pais acontece mesmo antes da entrada no mercado de trabalho.
Nos países nórdicos como a Noruega, a Dinamarca e a Suécia, as experiências de entrada no mercado de trabalho e de saída de casa dos pais tendem a ser praticamente simultâneas, sendo estes os países onde a independência residencial tende a ocorrer mais cedo na Europa, dentro da casa dos 19 anos.
Ainda no capítulo "Os Tempos de Vida", o inquérito revela que os portugueses esperam, em média, dois anos depois da saída de casa dos pais para a primeira experiência de conjugalidade, que na maior parte dos casos coincide com o primeiro casamento.
Mas se os portugueses avançam decididamente para o casamento, o mesmo já não acontece com a constituição de família. Segundo o estudo, Portugal, Holanda e Bélgica são "os países onde os inquiridos revelam mais tempo a tomar a decisão de ter o primeiro filho, depois de consagrado o casamento formal".
No caso dos países nórdicos, ao contrário, a transição do primeiro casamento para o primeiro filho é "justaposta, revelando que o casamento, quando acontece, tende a estar associado à constituição de uma família, depois de um período de experimentação conjugal a dois".
No que diz respeito à importância atribuída a cada um dos marcadores do "tempo de vida" para que se seja considerado adulto, a autonomia residencial é o mais valorizado nos países nórdicos, ao passo que em Portugal é o primeiro filho.
O estudo procurou também descobrir até que ponto se continuam a apontar idades ideais para casar, ter filhos ou sair de casa dos pais.
"Genericamente, ter relações sexuais antes dos 16 anos, viver com um parceiro antes dos 18 ou ter um filho antes dos 20 constituem eventos normativamente transgressores face ao padrão aceitável de ciclo de vida", refere.
No entanto, há marcos de vida que para os europeus não estão associados a qualquer idade ideal, como a entrada na conjugalidade ou a saída de casa dos pais.
Mas para a maioria dos portugueses, só é aceitável continuar a viver em casa dos pais até aos 30 anos idade.

Os mais tristes com a vida...
Os portugueses estão ainda entre os europeus que manifestam menor satisfação com a vida e felicidade, de acordo com este Inquérito Social Europeu de 2006.
Comparando com os resultados de inquéritos semelhantes realizados em 23 países europeus, Portugal ocupa "o quinto lugar mais baixo em bem-estar subjectivo, isto é, em felicidade e satisfação com a vida", revela.
Além do bem-estar subjectivo - que compreende avaliações acerca do grau de agradibilidade da vida -, o inquérito debruça-se igualmente sobre o bem-estar psicológico dos europeus, entendido como a visão mais profunda da qualidade de vida e o bem-estar social, equivalente à qualidade do funcionamento pessoal ao nível das relações com os outros e com a sociedade.
No que diz respeito ao bem-estar psicológico, Portugal está também abaixo da média europeia, ocupando o 16º lugar, entre 23, só à frente da Hungria, Federação Russa, Estónia, Eslováquia, Bulgária, Polónia e Ucrânia, que encerra a tabela.
No capítulo do bem-estar social, a posição portuguesa também não é brilhante. Numa tabela liderada pela Noruega, Portugal ocupa o 17º lugar, à frente da França, Rússia, Polónia, Ucrânia e Bulgária.
Os autores relacionam estes valores com o nível de desenvolvimento do país. "De facto, quanto maior o nível de desenvolvimento avaliado pelo índice de desenvolvimento do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) de 2007, maior o bem-estar subjectivo, psicológico e social", referem no estudo.

...e com a política
Os cidadãos portugueses estão também descontentes com a qualidade da democracia. Segundo o ESS só os russos, húngaros, ucranianos e búlgaros estão mais descontentes que os portugueses com o funcionamento da democracia e politicamente mais desinteressados. No extremo oposto encontram-se a Dinamarca, a Suíça e a Finlândia.
Estes resultados são semelhantes aos alcançados em edições anteriores do inquérito que é desenvolvido desde 2001 e mereceu em 2005 o prémio Descartes para a Investigação.
"É interessante constatar que a participação cívica e política está fortemente associada com todas as dimensões do bem-estar: os indivíduos com maiores índices de confiança interpessoal, interesse político, envolvimento comunitário e participação em actividades políticas e mais satisfeitos com a qualidade da democracia são também os que expressam maior bem-estar social, subjectivo e psicológico", referem os autores do estudo.

Li este artigo no Público de hoje. O inquérito ouviu 2222 portugueses desde 2006. Confiam nestes inquéritos?

Kommentare

  1. Olá Teresa

    É bem sintomático este resultado de análise à confiança dos portugueses no futuro e na vida do quotidiano. O que se pode dizer mais? É verdade, mas eu não quero nada com desconfianças, prefiro acreditar sempre, já disse noutra ocasião que sou utópica e posso mesmo dizer que sou feliz e despreocupada. E contra tudo eu acredito no sonho, o meu há-de ser realizado. O meu está muito perto de acontecer, tenho a certeza absoluta disso. Aqui está o testemunho de uma portuguesa que se mantém confiante no futuro. E não me vergo a "patacoadas" de resignações. Quem se resigna já morreu, quem desconfia dos outros sofre de baixa auto-estima.

    Beijinhos natalícios
    Isabel

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  2. Teresa voltei, mas não é pela desconfiança dos portugueses. No texto que publiquei não quis ferir susceptibilidades, por isso omiti o seguinte:

    Despudor/castigo, Subversão/poder, Transgressão/silêncio, palavras sérias que requerem uma atenção especial ao modo como na recepção do acto, ou do gesto, que ferem bons costumes, é implacável o sinal de castigo infligido pelo poder masculino para silenciar o poder do feminino. Poder este que sempre amedrontou os homens: o poder dos "ângulos ausentes", ou seja,da desnomeação que altera e desagrega toda uma tradição forjada à volta de limites e limitações impostas por um Minotauro insaciável, o mesmo que, abusivamente, S. Paulo retoma ao recomendar, sem qualquer legitimação teológica, que não a de impor a disciplina escolástica:
    "Do mesmo modo, quero que as mulheres se apresentem em trajes honestos, decentes e modestos...Que a mulher ouça a instrução em silêncio e em espírito de submissão. Não permito à mulher que ensine nem que se arrogue autoridade sobre o homem; convém que permaneça em silêncio, pois Adão foi formado primeiro e depois Eva." (1ª carta a Timóteo:2:9,15)
    Será conveniente recordar este discurso para compreender o sentido do decôro físico a emergir no corpo do texto, em contensão e suspensão do ser feminino, mito de mãe e musa.

    E vou embora, deixando beijinhos natalícios,
    Isabel

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  3. Um/a "artista" maldito ou nao tem de ferir susceptibilidades, por isso penso que é uma pena ter omitido esta parte.
    Estamos no século XXI. As palavras de Sao Paulo, nao nos interessam, a nós mulheres, absolutamente nada.
    Mesmo assim vou colocá-las no "ematejoca azul" para ler os comentários.

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  4. Boa-Tarde Teresa

    Bem eu não posso ir comentar lá acima, mas comento aqui. As palavras de S. Paulo são-me completamente indiferentes e não metem medo a ninguém. Mas ainda há mulheres que se guiam por estes preceitos e foi por elas que me senti retraída. A influência da religião de sacristia dos tempos idos de Salazar ainda está presente na forma como se expressam, no modo como subjugam a sua existência à do marido. E conheço algumas que, sendo infelizes, dizem que o seu dever é proporcionar ao companheiro condições para que ele se sinta realizado. É espantoso isto, mas é a realidade delas e só elas podem mudar essa realidade.

    Beijinhos e até logo
    Isabel

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  5. Por acaso não estranho muito que os portugueses não confiem nos seus políticos, que estão fartos de dar "brilhantes" exemplos de corrupção, panelinhas, tachos e cunhas, e nunca são culpados de nada quando alguma coisa corre mal!

    Quanto ao resto, já é um bocado o espírito tuga, de pessimismo e descontentamento, com ou sem razões. Suponho que mais optimismo faria muito bem a todos!

    Saudações natalícias!

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  6. Pois Teté...

    Mas não é mentira que votam sempre no mesmo... devem ter medo da esquerda, não devem estar fartos do capitalismo e da corrupção...

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  7. Seria razoável lembrar que este país viveu muitos anos sob a jugo duma implacável polícia política. Qualquer vizinho ou colega de trabalho podia telefonar para a sede daquela instituição difamando o outro (era comunista, decerto!). E passavam-se semanas, por vezes meses sem se saber o paradeiro do denunciado. Na aldeia onde nasceu a minha mãe (Lumiares-Armamar) prenderam o meu avô, trouxeram-no para interrogatório e os facínoras da PIDE concluíram que ele nem sequer sabia o que era o comunismo. Simplesmente não ia à missa ao Domingo depositar na cestinha a moeda tão ansiada pelo pároco da aldeia. Foi ele, o padre, quem o denunciou.
    Tanto havia a dizer sobre isto, mas os inquéritos ditos científicos procuram sempre as mesmas pessoas e os entrevistadores (raparigas e rapazes sem emprego, ganhando em função do nº. de entrevistas) não têm a mínima noção da realidade em que vivemos nos últimos anos.
    Tanto haveria a dizer sobre esta matéria...
    Beijinhos, cara Teresa
    António

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